Como realizar um bom processo de pós-colheita de grãos e sementes?

Por Juliana Soares Zeymer, Engenheira Agrônoma e Dra. em Engenharia Agrícola

O termo “pós-colheita” refere-se ao conjunto de práticas, técnicas e processos empregados após a colheita dos produtos agrícolas, com o objetivo de preservar sua qualidade e valor nutricional, além de viabilizar a comercialização adequada. 

A unidade de beneficiamento e armazenagem de grãos e sementes é uma instalação projetada para receber, processar, beneficiar e armazenar os produtos após a colheita.

Do transporte à expedição: as etapas da pós-colheita

Na etapa inicial da unidade armazenadora, os grãos recém-colhidos, com alto teor de umidade e impurezas, são transportados das lavouras em caminhões graneleiros e descarregados em estruturas denominadas moegas. 

Nessa fase, amostras representativas da carga são coletadas para análise dos teores de impureza, umidade e avariados, seguindo padrões técnicos de classificação.

Limpeza e aeração dos grãos

Em seguida, os grãos passam pelo processo de limpeza, em que são separados das impurezas por meio de máquinas equipadas com peneiras ajustadas para cada variedade de grão. 

Isso resulta na padronização do produto para comercialização, redução do consumo de energia elétrica e do risco de incêndio durante a secagem e minimização de pragas durante o armazenamento.

Os grãos limpos são, então, encaminhados ao silo pulmão, estrutura dotada de fundo inclinado e destinada à armazenagem temporária do produto úmido. 

Nessa fase da pós-colheita, é realizado o processo de aeração com fluxo de ar adequado, mantendo a temperatura da massa de grãos abaixo de 30 °C para evitar riscos de deterioração do produto enquanto aguardam a próxima etapa do processo.

Secagem e armazenagem dos grãos

Posteriormente, os grãos são submetidos à fase de secagem, conduzida em temperaturas elevadas, entre 80 e 100 °C, a depender da variedade do grão. O objetivo é reduzir a umidade do produto até teores entre 13 e 14%, garantindo o armazenamento seguro e duradouro. No caso da secagem de sementes, a temperatura deve ser mantida na faixa de 60 °C, a fim de evitar danos físicos ao produto.

Uma vez concluída a secagem, os grãos limpos e secos são armazenados em estruturas apropriadas, como silos e graneleiros.

Nessa etapa, é necessário atentar-se ao dimensionamento do fluxo de ar conforme o objetivo do processo, garantir que as propriedades psicrométricas do ar estejam adequadas para evitar tanto a supersecagem dos grãos, quanto o umedecimento do espaço intergranular, além de aplicar técnicas de aeração de acordo com o fenômeno de higroscopia do grão, com o objetivo principal de preservar a qualidade do produto armazenado.

Expedição dos grãos

A última etapa do processo de pós-colheita envolve o setor de expedição, que consiste em estruturas elevadas onde os caminhões são estacionados para carregamento. Os grãos são, então, expedidos para comercialização ou outros destinos, possibilitando sua utilização futura no consumo humano, animal ou fins industriais.

Como realizar uma pós-colheita eficiente?

Se todas as fases mencionadas forem conduzidas adequadamente, a pós-colheita proporciona uma série de benefícios que impactam positivamente toda a cadeia produtiva de grãos, desde os produtores até os consumidores finais. Aqui estão os principais:

  1. Comercialização em períodos adequados: escolha estratégica do momento correto para comercializar os grãos, permitindo aproveitar condições de mercado mais favoráveis e aumentar a rentabilidade do produtor;
  2. Abastecimento constante de alimentos ao longo do ano: condição essencial para manter a segurança alimentar da população, independentemente das variações sazonais da produção agrícola;
  3. Melhoria da gestão do estoque: permite aos produtores monitorar e controlar com precisão os grãos armazenados, reduzindo perdas e garantindo o fluxo contínuo de produtos ao mercado;
  4. Redução das filas de caminhões: proporciona eficiência na logística de transporte, agiliza o processo de comercialização e reduz custos operacionais;
  5. Manutenção da qualidade do grão: resulta em maior valor de mercado e garantia da segurança nutricional da população.

A importância da pós-colheita

A evolução da produção agrícola brasileira ao longo dos anos ressalta o papel crucial desempenhado pelo setor na economia nacional. 

De acordo com os dados do 12º levantamento da safra de grãos da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), que sinaliza o fechamento da colheita, a produção de grãos no Brasil na safra 2022/2023 atingiu 322,8 milhões de toneladas, aumento de 51,4 milhões de toneladas em relação ao ciclo anterior.

Para a safra 2023/24, a Conab estima produção de 294,1 milhões de toneladas de grãos, representando uma queda de 8% à obtida na temporada passada, devido principalmente às condições climáticas desfavoráveis.

Entretanto, ao analisar a evolução da produção brasileira de grãos nas últimas décadas, nota-se crescimento de aproximadamente 80% desde a safra 2010/2011 até os dias atuais (Figura 1).

Figura 1. Histórico da produção de grãos versus capacidade estática de armazenamento no Brasil. Fonte: Conab.

Desafios da pós-colheita

É crucial não apenas aumentar a produção, como também garantir que os alimentos alcancem os consumidores em quantidade e qualidade adequadas. 

Um dos principais desafios enfrentados na área da pós-colheita de grãos no Brasil é a discrepância entre o aumento exponencial da produção agrícola e a capacidade limitada de armazenamento. 

Nos últimos dez anos, a armazenagem cresceu, em média, 2,8% ao ano, enquanto as safras avançaram 5,5% ao ano. Esse desequilíbrio se intensifica à medida que a produção de grãos continua a crescer, resultando em déficits cada vez maiores na capacidade de armazenagem, conforme ilustrado na Figura 1.

Atualmente, o Brasil conta com uma capacidade estática de armazenagem de aproximadamente 190,9 milhões de toneladas. Diante da produção de grãos na safra 2022/2023, evidencia-se um déficit de armazenagem preocupante de 131,9 milhões de toneladas. 

Mesmo com a redução estimada da produção para a safra 2023/2024, o país ainda enfrenta um déficit de 103,2 milhões de toneladas. Isso significa que dispomos de capacidade para armazenar apenas 64,9% da nossa produção, enquanto nos Estados Unidos, maior produtor mundial de grãos, essa capacidade se aproxima de 120%.

Outro fator extremamente importante a ser considerado está na má distribuição e localização das unidades armazenadoras no país, geralmente distantes dos campos de produção. 

No Brasil, apenas 15% da capacidade estática de armazenagem encontra-se instalada em nível de fazenda, ou seja, na própria propriedade onde o grão foi produzido. Segundo a Conab, em comparação com outros países mais estruturados em termos de pós-colheita, como os Estados Unidos, 65% da capacidade total de armazenagem está na fazenda, enquanto na Argentina esse percentual corresponde a 40%.

Como superar os desafios da pós-colheita?

Dessa forma, é fundamental reconhecer as consequências dessa falta de espaço para armazenar a produção agrícola e buscar soluções para melhorar a infraestrutura e garantir a sustentabilidade do setor agrícola brasileiro. 

O principal meio para isso é através de fontes de financiamento de projetos, como o último divulgado pelo Programa de Armazenagem Nacional (Proana), cujo objetivo principal é ampliar a capacidade de armazenagem de grãos no Brasil, buscando reduzir a distância média percorrida pelos produtores até os armazéns terceirizados.

A implementação de uma política agrícola voltada para a armazenagem na fazenda e para a implantação de unidades armazenadoras em regiões produtoras onde a demanda de armazenagem seja elevada contribuirá para a elevação do nível de renda dos produtores, que terá redução nas perdas e nos riscos decorrentes das flutuações dos preços. 

Por outro lado, tal política também favorece os consumidores, que podem contar com o abastecimento contínuo de alimentos durante todo o ano e se beneficiar de preços mais estáveis nos locais de venda.

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